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ARRIBAS DE FORNOS, INCÊNDIO EM AGOSTO DE 2025

  • Writer: Nuno de Santos Loureiro
    Nuno de Santos Loureiro
  • Aug 23
  • 5 min read

Updated: Aug 24

Em Agosto de 2025 um incêndio rural atingiu a quase totalidade de uma propriedade da FAIA BRAVA - Associação de Conservação da Natureza designada de ARRIBAS DE FORNOS, localizada nas proximidades de Lagoaça, concelho de Freixo de Espada à Cinta. De acordo com o website fogos.pt, o incêndio ocorreu entre as 13 h 17 min do dia 15 de Agosto e as 8 h 8 min do dia 20 de Agosto. Teve início em Poiares e foi evoluindo progressivamente para Norte.


As ARRIBAS DE FORNOS foram atingidas entre a tarde de 16 de Agosto e o dia 17 de Agosto. A Figura 1 apresenta a extensão da área afectada e uma classificação provisória da severidade do fogo, avaliada através do NBR (Normalized Burn Index), de acordo com as recomendações do EFFIS (European Forest Fire Information System). Constata-se que a quase totalidade da propriedade foi atingida por um fogo de severidade baixa, facto que não surpreende porque a vegetação predominante era de porte arbustivo, principalmente composta por giesta-branca (Cytisus multiflorus), uma espécie endémica da Península Ibérica.


Fig. 1. Área afectada e caracterização da severidade do fogo de acordo com o NBR (Normalized Burn Ratio).
Fig. 1. Área afectada e caracterização da severidade do fogo de acordo com o NBR (Normalized Burn Ratio).

Ao final da manhã de 16 de Agosto, a frente de fogo que mais tarde iria atingir as ARRIBAS DE FORNOS localizava-se a Oeste da propriedade, como se pode constatar pela observação da Figura 2, que apresenta uma imagem do Sentinel-2B. Essa frente de fogo avançaria predominantemente de Oeste para Este, acabando por invadir a propriedade da FAIA BRAVA - ACN.


Fig. 2. Situação do incêndio ao final da manhã de 16 de Agosto.
Fig. 2. Situação do incêndio ao final da manhã de 16 de Agosto.

Este incêndio de Agosto de 2025 veio pôr fim a um período de 8 anos sem fogos nas ARRIBAS DE FORNOS. De acordo com o geoCATÁLOGO do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas) há registos anteriores de fogos em 2017, 2011, 1998, 1988 e 1985. São assim seis eventos em 40 anos, ou seja, uma média de um evento em cada 6,67 anos.


Pode-se concluir que a gestão feita pela FAIA BRAVA - Associação de Conservação da Natureza, anteriormente designada ATN - Associação Transumância e Natureza, não tem sido suficientemente competente para pôr fim a este ciclo vicioso de degradação ambiental, com repercussões na qualidade do solo e da água, na biodiversidade vegetal e animal, e na paisagem de uma propriedade com cerca de 130 hectares que integra o Parque Natural do Douro Internacional.


A Figura 3 ilustra a área ardida em Julho de 2017, cartografada com base no já referido geoCATÁLOGO do ICNF. Podem-se constatar bastantes semelhanças entre a distribuição do incêndio rural de 2017 e a do de 2025. Dois parâmetros, um topográfico e outro vegetal, devem ser tomados em atenção na avaliação do risco de incêndio rural e florestal neste território, e não devem, simultaneamente, ser esquecidos em planos futuros de gestão da propriedade e dos seus riscos ambientais: as arribas, marcadas por numerosos afloramentos rochosos, declives muito acentuados e vegetação dispersa de porte arbóreo, têm reduzida propensão para serem afectadas pelo fogo; em oposição, as áreas na rectaguarda das arribas, com declives reduzidos e sem utilização agrária regular, e que são consequentemente ocupadas por matagais, ou seja, vegetação arbustiva contínua, têm elevada  propensão para serem afectadas pelo fogo. Adicionalmente, o círculo vicioso de fogos tem impedido a instalação espontânea de plantas de porte arbóreo, nomeadamente do género Quercus, que vão surgindo mas são sucessivamente atrofiadas ou destruídas pelos fogos cíclicos.


Fig. 3. Área ardida em Julho de 2017, de acordo com o geoCATÁLOGO do ICNF.
Fig. 3. Área ardida em Julho de 2017, de acordo com o geoCATÁLOGO do ICNF.

O acesso a imagens em ‘falsa cor', combinações das bandas NIR (B08), RED (B04) e GREEN (B03), obtidas a partir de imagens de satélites e drones, proporciona um olhar particularmente perspicaz sobre a vegetação e a forma como a mesma é/foi afectada pelo fogo. Neste tipo de imagens é necessário ter presente que a vegetação folhosa verde surge representada a vermelho, com tonalidades variáveis relacionadas com a densidade de folhas, a hidratação da biomassa vegetal viva, o seu estado sanitário e também as espécies vegetais presentes. Espécies vegetais características de matagais colonizadores xerofíticos, como a giesta-branca, surgem representadas a verde escuro. Terrenos agrícolas cultivados e sem vegetação herbácea a cobrir o solo surgem com tonalidades bastante claras, próximas do branco. Volumes de água surgem representados com cores muito escuras. Áreas recentemente ardidas surgem a preto ou com tonalidades muito escuras de cinzento.


A Figura 4 apresenta as ARRIBAS DE FORNOS e territórios circundantes poucos dias antes do incêndio de Agosto de 2025. É expressivo o contraste entre as arribas (a vermelho) e a rectaguarda das mesmas (a verde escuro), a vegetação associada aos cursos de água (a vermelho) e o Rio Douro (a preto). A qualidade e a resolução horizontal de 10 metros são até suficientes para identificar a estação de aclimatação para o abutre-preto (Aegypius monachus) e o campo de alimentação suplementar para aves necrófagas, estruturas instaladas no interior da propriedade pela ONG Palombar - Conservação da Natureza e do Património Rural, no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return.


Fig. 4. Imagem em Falsa Cor de 1 de Agosto de 2025.
Fig. 4. Imagem em Falsa Cor de 1 de Agosto de 2025.

A Figura 5, preparada com procedimentos idênticos aos adoptados para a Figura 4, apresenta a situação logo após o final do incêndio, e são evidentes os contrastes entre as duas figuras. De destacar, com base nessa comparação, que:

  • é perceptível alguma redução do vermelho nas arribas, indicador de que estas foram parcialmente atingidas pelo fogo,

  • é por demais evidente a substituição do verde escuro relacionado com a giesta-branca pelo preto ou cinza muito escuro, indicador de que todo esse matagal foi totalmente queimado,

  • merece atenção o desaparecimento acentuado das faixas vermelhas associadas à vegetação arbórea e arbustiva verde das margens dos cursos de água, indicador de que essa vegetação ripícola, de reconhecida importância para a biodiversidade e para a regulação do escoamento superficial concentrado, foi também bastante afectada pelo fogo,

  • por fim, áreas com o solo mobilizado, agricultadas com cereais, olivais e outros cultivos, parecem ter sido pouco atingidas pelo fogo.


Fig. 5. Imagem em Falsa Cor de 21 de Agosto de 2025.
Fig. 5. Imagem em Falsa Cor de 21 de Agosto de 2025.

Toda esta abordagem científica que aqui se apresenta deve ter continuidade, quer ao longo do tempo, quer no que diz respeito à resolução espacial horizontal. No eixo do tempo, o cálculo do NDR deve ser revisto um mês após o final do incêndio. Posteriormente, deve ser revisto anualmente, para ser utilizado como indicador da recuperação da vegetação e de todo o ecossistema. A repetição dos procedimentos relacionados com as imagens em ‘falsa cor’ deve igualmente ser levada a cabo, para que esteja periodicamente disponível outro indicador de recuperação ambiental.


Um outro eixo que não deve ser descurado é o da preparação de imagens em ‘falsa cor’ a partir de coberturas aéreas feitas com drones multi-espectrais, que asseguram resoluções muitíssimo superiores às dos satélites da constelação Sentinel. Coberturas aéreas com resoluções horizontais da ordem dos 5 cm, tendo como termo de referência os 10 metros fornecidos pelos Sentinel-2, proporcionarão certamente mais e melhor informação para analisar, interpretar e caracterizar a recuperação pós-fogo das ARRIBAS DE FORNOS.

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